Suzana Pires encontra sua voz de autonomia: roteirizar como manifesto pessoal

A trajetória de Suzana Pires ultrapassa o campo da atuação: há tempos, ela vem construindo um espaço potente como roteirista, escritora e produtora. Mais do que inserir-se em narrativas já existentes, Suzana reivindica o ato de escrever como lugar de autonomia — uma reivindicação que se revela tão artística quanto política, tão estética quanto transformadora.

Em seu mais recente trabalho no cinema, a artista estreia como roteirista do filme De Perto Ela Não É Normal, adaptação de seu próprio monólogo teatral. A transição entre palco e tela exigiu dela não só domínio de linguagem e ritmo, mas uma posição de comando criativo. Ela assume múltiplas funções: autora do texto original, roteirista da adaptação, produtora associada com atuação ativa nas negociações e escuta fina das escolhas que traduzem sua visão, além de interpretar personagens-chaves.

Esse movimento não é isolado. Ele se conecta a uma prática contínua de Suzana na criação de conteúdos que dialogam com o feminino não apenas como tema, mas como forma de existência. A escolha de pautas, construção de personagens e decisões editoriais revelam uma consciência clara das desigualdades de gênero, raça e poder no audiovisual. A partir dessa consciência, ela busca dissolver padrões — propor formas mais plurais, mais próximas da realidade que viveu e que observa ao seu redor.

A autonomia, para Suzana, é também uma questão estrutural. Envolve assumir riscos, escolher projetos alinhados com seus valores, insistir numa voz que muitas vezes é ofuscada por modelos tradicionais de poder — nas redações, nas produções de TV ou Cinema. O “escrever é meu lugar de autonomia” não soa como frase de efeito, mas como princípio de sustentação de carreira. É equilibrar a atuação expressiva com decisões que determinam o que será contado, como será contado e com quem será contado.

Além disso, sua atuação vai além da arte. Ela idealizou o Instituto Dona de Si, um espaço voltado para formação e empoderamento de mulheres no mercado audiovisual, incentivando talentos femininos a conquistarem seu lugar de fala, seus espaços de decisão. Essa iniciativa reflete a crença de que autonomia plena não se alcança somente com sucesso pessoal, mas com a construção de redes de apoio, de equidade e de acesso.

Em suas declarações, Suzana reconhece que o percurso não foi simples — escassez de oportunidades, resistência nos bastidores e necessidade de provar competência para além do que esperado. Mas também celebra conquistas: o olhar mais atento do público, o reconhecimento de pares, a possibilidade de criar com liberdade. E mais do que isso, uma certeza: que escrever, produzir, dirigir — em tudo aquilo que escolher — é exercer potência.

Essa nova fase de Suzana Pires representa muito mais que a expansão de seu currículo; é uma afirmação de que o lugar de artista brasileiro — e especialmente de mulher — pode transcender os papéis tradicionais se houver determinação, compromisso estético e coragem política. Suzana escreve porque quer existir no mundo à sua própria maneira, convidando outras pessoas — mulheres, sobretudo — a se verem iguais no ato de criar, de contar, de transformar.